BASTIDORES DO CLIPE DA BANDA LUST

Uma banda lutando por reconhecimento e uma produtora jovem e cheia de idéias: os ingredientes que fizeram de “Make a Wish and Disappear” um videoclipe de alto impacto

 

Por Eduardo Torelli

Fotos Divulgação

 

 

Os tempos são difíceis, mas não há como negar: com o advento do digital, realizar produções caprichadas ficou bem mais fácil. Além disso – abstraindo-se as questões técnicas –, há demanda por conteúdos e canais de exibição de sobra por aí, uma evolução notável desde o tempo em que meia dúzia de emissoras resumia a nossa idéia de “mídia eletrônica”. Com este cenário propício, o produtor independente só precisa ter criatividade e estar em dia com as novidades tecnológicas para transformar suas idéias em produções finalizadas. E que campo é mais propício para o exercício dessa criatividade que o dos videoclipes?

Sim – eles não deixam de ser produzidos, apesar da crise econômica, das dificuldades por que passa a indústria fonográfica e a efemeridade dos ídolos atuais, que se sucedem à velocidade da luz. Artistas querem boas peças audiovisuais para divulgar suas músicas. O ramo continua não “pagando bem”; mas – e justamente por isso – conta com a simpatia e o empenho dos profissionais de vídeo, pela criatividade que proporciona e a liberdade de exercitar novas técnicas e idéias.

A Zoom Magazine mostra os bastidores de um original videoclipe realizado pela produtora NR, há mais de vinte anos no mercado e comandada por Luciano Marques. O próprio Luciano assina o audiovisual e confirma a opinião de muitos realizadores sobre esse atraente e nebuloso segmento da videoprodução: clipes não dão dinheiro – mas são grandes vitrines para novos talentos, sejam eles músicos ou aspirantes a cineastas. Sorte da banda Lust, que agora poderá ser vista na telinha em um audiovisual caprichado, digno de aristas com muitos anos de estrada.

“Conhecemos o trabalho desse grupo há algum tempo e o clipe da música ‘Make a Wish and Disappear’ favoreceu ambas as partes”, conta Luciano, da NR. “Para a produtora é um bom currículo, por ser um campo que cresce muito no mundo inteiro, além desse tipo de projeto ser excelente para os diretores expressarem suas linguagens.” Luciano ressalta que, por ser uma obra colaborativa, o clipe também isenta o realizador de se fixar em muitas regras (imperativas em curtas ou longas-metragens). “Mesmo assim, são necessários os mesmos cuidados no tocante à fotografia, à direção cênica e a outros aspectos comuns a clipes e filmes”, observa Luciano.

 

FÁBULA JOVEM

A trama do videoclipe exalta os mesmos valores eternos atribuídos à juventude desde Elvis Presley a Amy Winehouse, passando pelo filme Hair e os clipes da banda “oitentista” Twisted Sister: a luta pela afirmação da individualidade, a libertação da opressão e da hipocrisia. No caso, nosso “herói” é um jovem enclausurado em uma redoma de classe média alta que, de repente, vira a mesa e vai buscar sua felicidade. Segundo os produtores, o clipe objetiva expressar os sentimentos da garotada, submetida a um excesso de regras e que anseia por experimentar um pouco de diversão.

“Na hora de elaborar o roteiro criamos esse personagem essencial, um garoto muito controlado e ansioso por jogar tudo para o alto”, continua Luciano, explicando a base conceitual do projeto. “Também decidimos adotar uma linguagem um pouco jornalística na captação, buscando um visual livre e descolado para, na ilha de edição, formatá-lo de forma apelativa para os jovens, que são o público-alvo desta produção.”

Os takes foram captados em Guarulhos, em São Paulo, em locações escolhidas com muito cuidado para cada “núcleo” do videoclipe – a saber: o espaço aberto em que a banda aparece tocando, a sala de jantar onde o protagonista atinge seu “limite” e se rebela (para horror da namorada e de seus familiares) e o visual tipicamente “bairrista” onde o personagem central se reúne aos amigos, em busca da almejada liberdade.

“A externa onde fizemos a master shot (o longo plano seqüência que, nos videoclipes, é a “espinha dorsal” da edição, ganhando inserts de diferentes ângulos e perspectivas ao longo da montagem) tinha um visual grafitado, além de fábricas velhas ao fundo que, achamos, casaram perfeitamente com o estilo despojado da banda”, conta o diretor. “As demais locações foram a sala de jantar, com um clima bem elegante, e a rua arborizada onde os amigos conversam.”

Luciano observa que, embora o sistema de master shot seja uma fórmula consolidada no gênero, isto não exime o realizador de tomar diversos cuidados ao orquestrar as cenas: por exemplo, não se pode descuidar do sincronismo, das sutilezas da fotografia e mesmo das expressões do cantor e dos músicos. “Administrando esses aspectos com atenção, há menos dores de cabeça na edição”, garante o diretor. No total, o registro das imagens consumiu duas diárias.

 

TIPO EXPORTAÇÃO

O clipe foi gravado com uma câmera JVC GY-HD110u. Mas, segundo Luciano, o “pulo do gato” foi a adoção de um conversor de 35mm da PS Technics, formato 720p e com lentes Zeiss 1.3, proporcionando notável profundidade de campo em enquadramentos de diversas aberturas. Já que o dispositivo aproxima muito as imagens obtidas daquelas proporcionadas por películas de 35mm, foi preciso tomar os mesmos cuidados exigidos em uma filmagem com esse tipo de bitola – especialmente no que se refere à luz. “Esta é uma técnica consolidada no mercado de produtoras de pequeno e médio porte, por permitir um material de alta qualidade a um custo bem acessível”, acrescenta Luciano. “Levando em conta o preço astronômico de uma captação em 16mm ou 35mm, é inegável que o digital ganha disparado, seja na gravação, seja na montagem.”

Com as cenas registradas, o diretor se concentrou na fase mais lúdica de um projeto audiovisual: a edição. E se em um projeto de longa-metragem a ordenação dos takes é capaz de dar uma orientação completamente distinta ao material captado, no videoclipe este aspecto é maximizado. Afinal, inicialmente, a produção é apenas uma master shot sem ritmo ou movimento, à qual serão adicionados enxertos de imagem e efeitos que lhe darão “cara” e “pique” próprios. Na época em que este artigo era apurado, a NR Produções já tinha uma versão final do clipe, mas o projeto ainda ganhava retoques finais na ilha de edição para chegar perfeito às emissoras de TV. A montagem, acompanhada pelo próprio Luciano, foi realizada em Final Cut.

Experimentação, pouca verba, grandes desafios superados com a ajuda da tecnologia… Será esta uma realidade geral para o segmento de videoclipes? Luciano acredita que não – para ele, tais condições são impostas pelo mercado brasileiro, que tem regras muito próprias no que diz respeito a esse tipo de material. O diretor observa que o mercado de videoclipes é pequeno em nosso país, em comparação aos EUA e à Europa. “Aqui as gravadoras apostam muito em shows e investem cautelosamente em videoclipes, avaliando o retorno que este ou aquele artista lhe dará com esse tipo de divulgação”, teoriza o realizador. “Já nos EUA, investe-se mais nessas produções, razão pela qual queremos divulgar nossa mão-de-obra nos mercados estrangeiros”, conclui Luciano.

 

 

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