ENTREVISTA COM O CINEASTA AARÓN FERNÁNDEZ

Saiba sobre os processos de escrita, produção e direção empregados pelo cineasta mexicano Aarón Fernández, autor de Partes Usadas

 

Por Ananda Guimarães

 

Aarón Fernandéz nasceu no México e estudou cinema na Sorbonne (em Paris, França), onde se especializou em direção e roteiro. Desde o ano passado, vive no Brasil – e em maio de 2009 passou a integrar o time de professores de roteiro da Academia Internacional de Cinema – São Paulo.

 

Sua estreia em longas-metragens se deu em 2007, com o filme Partes Usadas (ele, atualmente, desenvolve seu segundo longa, Las Horas Muertas, escrito dentro do programa de residência auspiciado pela Cinéfondation do Festival de Cannes).

 

Partes Usadas esteve em mais de 35 festivais internacionais, obtendo prêmio de Melhor Filme de Estréia no Festival de Cine en Guadalajara 2007 (Guadalajara, México); prêmio “Glauber Rocha” de Melhor Filme Latino-Americano do Festival des Films du Monde, de 2007 (Montreal, Canadá); segundo prêmio na categoria Filme de Estréia do Festival del Nuevo Cine Latinoamericano, de 2007 (Havana, Cuba); e o de Melhor Filme do Cinesul 2008 (Rio de Janeiro, Brasil). Em nosso país, também foi selecionado para a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, o Festival do Rio e o Festival de Cinema Latino-Americano, em São Paulo (2008)

 

Nesta entrevista, o autor fala sobre a experiência e a trajetória de seu primeiro filme, além de descrever seu processo de trabalho.

 

A PARTIR DE UM RETRATO SOCIAL DO MÉXICO, PARTES USADAS ABORDA A AMIZADE E A CUMPLICIDADE. VOCÊ AFIRMOU NÃO QUERER JULGAR OS PERSONAGENS, MAS DESCREVÊ-LOS DE MANEIRA CÂNDIDA. O TRABALHO COM ATORES TÃO JOVENS ABRIU MAIS POSSIBILIDADES DE ENCONTRAR ESSE MODO SUTIL DE RETRATÁ-LOS?

O trabalho com todos os atores foi muito legal. Queria trabalhar com não-atores e intérpretes pouco conhecidos (ou seja, que não tivessem trabalhado em novelas, por exemplo), porque precisava de rostos novos e anônimos. Para os garotos, fizemos um casting criterioso. Era condição obrigatória que fossem muito parecidos às personagens, do mesmo extrato social, com a mesma linguagem etc. Tivemos sorte e achamos dois garotos incríveis. Para Eduardo Granados (Iván), é o primeiro trabalho de sua vida. Já Alan Chávez (Efraín) tinha um pouco de experiência em outros filmes. Os dois funcionam bem juntos, se complementam. Não fizemos ensaios ou laboratórios, só um pouquinho de treinamento para dirigir a moto e a dança do Pump-it Up; só isso. Não queria que chegassem “viciados”. Guardamos toda a espontaneidade para as filmagens. Quanto ao tom do filme e das atuações, mais do que “cândidas”, acho que são líricas. Queria um contraponto de leveza e lirismo frente à dura realidade.

 

O FILME É UMA CO-PRODUÇÃO DE TRÊS PAÍSES: MÉXICO, FRANÇA E ESPANHA – UMA “CONFIGURAÇÃO” QUE DEVE SE TORNAR CADA VEZ MAIS COMUM. COMO ESSA PARCERIA SE FORMATOU? E COMO FOI A DISTRIBUIÇÃO NESTES PAÍSES?

Foi uma maneira relativamente mais fácil de arrecadar dinheiro e de criar certa curiosidade para o IMCINE (Instituto Mexicano de Cinematografia). Tendo o apoio dos co-produtores franceses e espanhóis, era mais fácil obter o dinheiro no México. Além disso, o filme estreou nesses países, o que lhe deu uma carreira internacional. Não obtivemos resultados muito importantes, mas, para a escala do filme, foram razoáveis. A obra também estreou no México e foi lançada em DVD e na TV nos EUA, Canadá, Turquia, Índia e Egito. Além de ser comprada pela HBO para toda a América Latina.

 

NA TRILHA SONORA, VOCÊ TRABALHOU COM O BRASILEIRO LÚCIO MAIA E A BANDA NAÇÃO ZUMBI, QUE TÊM TRABALHOS CONTUNDENTES E POLITIZADOS…

Sempre quis que o filme tivesse uma parte brasileira, porque me sinto muito próximo do Brasil. Queria usar duas músicas da Nação Zumbi, do disco “Rádio Samba”. Mas, quando entrei em contato com eles, me propuseram fazer música original e eu topei. Gostei muito do resultado. Todo o trabalho foi feito de longe, pela Internet, mas o resultado ficou muito bom.

 

COMO É SEU PROCESSO DE ESCRITA DO ROTEIRO? COSTUMA REALIZAR ALGUM TRABALHO DE PESQUISA?

Depende muito do ponto inicial. Mas quase sempre a ideia do roteiro nasce de uma locação real ou uma personagem real que encontro. Então, é sempre um elemento concreto. Para Partes Usadas, fiz um pouco de pesquisa, sim. Mas, sobretudo, me inspirei nos lugares onde filmei. Estive neles muitas vezes, observando as pessoas. Acredito muito no método de observação e meu filme é um pouco assim: descreve o trabalho e os gestos das personagens. Cabe dizer que o processo foi longo, durou quase três anos, e que a história foi evoluindo. Mas foi um período necessário de amadurecimento.

 

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