INFERNO PARTICULAR
Realizado com garra e sensibilidade pela dupla de cineastas Guto Parente e Pedro Diógenes, Inferninho conta uma tragédia bem brasileira
Produto de uma parceria entre dois grupos artísticos – um de teatro e outro de cinema –, o longa-metragem Inferninho é um feliz encontro da dramaturgia com o audiovisual. A direção é de Guto Parente e Pedro Diógenes, que realizaram uma obra bem-sucedida em vários níveis: intimista, emotivo e magistralmente fotografado, o longa deixa uma forte impressão no espectador, ao mesmo tempo em que denuncia alguns preconceitos arraigados na cultura brasileira e expõe o calvário vivido por pessoas que não se enquadram em padrões sociais pré-estabelecidos.
Antes de estrear em nossas salas de cinema, a produção passou pelo Festival de Rotterdam e pelo Festival Queer Lisboa (onde arrebatou o prêmio de Melhor Filme). O longa também foi o grande vencedor da décima primeira edição do Janela Internacional de Cinema do Recife, conquistando os prêmios de Melhor Filme e Melhor Imagem (Júri Oficial) e Melhor Filme (Júri da Crítica). Inferninho ainda brilhou na Mostra Internacional de Cinema de São Luís, vencendo nas categorias de Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Ator.
“Até algum tempo atrás, eu e Pedro Diógenes fazíamos parte do coletivo de cinema Alumbramento, que durou dez anos e realizou mais de dez longas e 30 curtas”, revela Guto Parente, em entrevista à Zoom Magazine, relembrando a gênese do projeto. “A Alumbramento sempre teve uma relação de troca com outros grupos e artistas de Fortaleza, incluindo o Grupo Bagaceira de teatro, que, em 2013, nos propôs parceria em um laboratório de roteiro para série de televisão. O embrião do que seria desenvolvido naquele laboratório se transformou na ideia para uma peça chamada Inferninho, a qual o grupo nunca colocou no papel ou encenou, mas que achavam ter tudo a ver com o nosso cinema”.
Eventualmente os cineastas perceberam que a trama poderia ser melhor explorada na forma de um longa-metragem. “A partir deste entendimento, o roteiro passou por uma completa transformação”, prossegue Guto. “A história ganhou novos contornos, personagens e pontos de virada. Passamos a trabalhar em um território mais confortável – já que nenhum de nós, até então, havia realizado nada para a TV –, e de maneira mais livre e despreocupada. Quando fizemos uma primeira leitura do novo roteiro junto com o elenco, poucas semanas antes do início da pré-produção, foi marcante a surpresa do grupo com o que havia de novo ali”.
PARCERIA CRIATIVA
O filme mostra a trajetória de Deusimar (Yuri Yamamoto), dona do tal “Inferninho”, bar que é um refúgio de sonhos e fantasias. A protagonista quer deixar tudo para trás e iniciar uma nova vida, mas acaba conhecendo o marinheiro Jarbas (Démick Lopes), por quem se apaixona. A relação afetiva entre os personagens acaba influindo na rotina do estabelecimento e nas vidas das pessoas que ali coexistem: a cantora Luizianne (Samya de Lavor), o garçom “Coelho” (Rafael Martins) e a faxineira Caixa-Preta (Tatiana Amorim), entre outros tipos curiosos que povoam a trama.
Um projeto totalmente autoral e independente, Inferninho compensa, com engenhosidade e talento, as restrições orçamentárias impostas à equipe de produção. A verba limitada não permitia muitas diárias, razão pela qual optou-se por utilizar uma única locação para a captação das cenas. “De outra maneira, não conseguiríamos filmar as oitenta e tantas páginas do roteiro”, observa Guto. “Assim, alugamos o galpão de um amigo em uma fazenda longe da cidade e o transformamos em um estúdio. A estrutura da fazenda permitiu que a equipe ficasse hospedada ao lado do set, eliminando o tempo perdido com deslocamentos”.
O cenário do bar foi idealizado pela diretora de arte Taís Augusto. Já as cenas ambientadas no quarto de Deusimar foram rodadas em um dos quartos da fazenda. Captado com uma câmera Sony FS100, Inferninho se beneficiou muito do talento de Victor de Melo, diretor de fotografia do filme. “Eu, Pedrinho e Victor fomos colegas de classe na Escola do Audiovisual de Fortaleza, onde nos formamos em 2008”, recorda o cineasta. “Victor fotografou o primeiro curta que eu e Pedrinho dirigimos juntos na escola, Cruzamento, em 2007. Assim, existe uma relação de amizade e trabalho construída entre nós, que permite um entendimento muito rápido das intenções de cada um”. Os diretores e o fotógrafo definiram juntos o visual do longa, que possui uma atmosfera “felliniana” em algumas cenas. Uma das decisões foi a de nunca mostrar o bar em planos gerais, já que a proposta era revelar o espaço ao espectador de forma fragmentada…
* A matéria completa você encontra na edição 214 da Zoom Magazine
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