Projeto Re_Modelar, Lucas de Freitas encanta com imagens do Brasil

No projeto Re_Modelar, Lucas de Freitas encanta o público com imagens do Brasil

Inspirando-se na obra de Sebastião Salgado, contribuidor da Shutterstock retrata com delicadeza situações do cotidiano

Lucas de Freitas se iniciou na fotografia muito cedo, a princípio, fazendo seus registros de imagem com uma Cybershot. Além de sua inata habilidade com a câmera, o jovem fotógrafo (hoje, com 24 anos de idade) sempre teve facilidade para lidar com as pessoas, o que influenciou seu trabalho. Ele consegue capturar o melhor de seus modelos, registrando momentos de espontaneidade e enaltecendo a beleza da diversidade brasileira em suas obras.

Lucas também é adepto da célebre frase de Glauber Rocha: “Uma ideia na cabeça e uma câmera na mão”. Curioso por natureza, ele estudou muito ao longo de sua formação e foi além das tradicionais apostilas, indo atrás de informações e experiências para aprimorar sua técnica. Outra inspiração para o artista é a obra do premiado fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado.

Em fotos de suas passagens pelo mundo, um dos mais novos contribuidores da rede global de artistas da Shutterstock faz o público viajar pelo Brasil por meio de seus cliques.

Como fotógrafo convidado para o Projeto Re_Modelar (parceria entre a Shutterstock e a agência WMcCann, criada com o objetivo de ampliar a representatividade autêntica da população negra do País na propaganda), ele passou por uma jornada de mentoria e acabou remodelando a si próprio como pessoa e profissional. Saiba mais neste bate-papo com o fotógrafo, que relembra sua trajetória até o momento e comenta a sua experiência no projeto.

A representatividade faz a pessoa se ver ali e se identificar

SHUTTERSTOCK: Comecemos pelo início: como você entrou para a fotografia?

Lucas de Freitas: Eu tirava fotos e gravava vídeos da família, dos eventos da família… eu era o fotógrafo “quebra-galho”, na época, entre os conhecidos, que me pediam para tirar fotos. Com o tempo, fui criando uma grande paixão. Entrei na faculdade, me formei em Rádio e Televisão e adorei. Comecei a ganhar mais conhecimento. No início, tirava muitas fotos de paisagens e de natureza.

Você acabou se especializando em retratos. Como foi este movimento?

As pessoas me perguntavam por que eu não tirava fotos de pessoas, e enfrentei um desafio comigo mesmo. Afinal, a paisagem e a natureza já estavam ali, prontas para serem clicadas. Já capturar os momentos de pessoas com baixa autoestima era mais complexo – estas pessoas se consideravam incapazes de participar como modelos de uma sessão de fotos. Com meu jeitinho, fui convidando, com o argumento de que era importante para meu aprendizado. E com o tempo, ganhei mais experiência em como lidar com as pessoas para os ensaios. Hoje, adoro fazer retratos e o Re_Modelar me fez ampliar a visão sobre capturar os sentimentos das pessoas.

Você tem um cuidado especial com seus modelos fotográficos. Poderia nos contar como é esta relação?

Fazer ensaio comigo é uma coisa muito engraçada. Eu sou uma pessoa séria e tranquila, mas quando estou na sessão de fotos, mesmo as pessoas que não me conhecem direito acabam rindo comigo. Às vezes, as pessoas que estão sendo fotografadas pela primeira vez se sentem inseguras. Sempre digo para relaxarem, faço uma graça e já começam a rir, se soltar, e a sessão segue de uma forma natural. A humanização precisa estar presente – não cabe ser uma máquina e afirmar “vou fazer um ensaio assim” e direcionar as poses de uma forma muito fechada. Eu gosto de capturar a espontaneidade e sempre prezo pela naturalidade. Gosto de fazer fotos na rua, andando por São Paulo. Então, vamos caminhando, conversando… e quando encontro um lugar perfeito, paramos para tirar as fotos. A pessoa já está mais confortável e as coisas fluem naturalmente. A escolha do local, principalmente, tem a ver com o estilo da pessoa. Por exemplo, se ela tem um estilo mais street, procuro o lado urbano de São Paulo. Já se ela, por exemplo, está com um vestido floral, busco um local que combine, que mostre mais a natureza e o verde. É um exercício de sensibilidade, de perceber a energia da pessoa, e sempre consulto se se sentem confortáveis naquele ambiente.

Dias claros tornam as cores mais vivas

Como você enxerga a sua evolução ao longo da sua carreira?

Tenho muito orgulho de ter tirado fotos “horríveis” (estouradas, desfocadas) lá atrás e, hoje, perceber as pessoas interessadas sobre como edito as minhas fotos. E a verdade é que quase não edito as minhas fotos. Basicamente ajusto um pouco a saturação, a luz e o contraste. Para isso, aprendi a configurar a câmera. Ao dominar os três pilares da fotografia, você pode tirar qualquer foto e transitar por diferentes áreas. E nada de setup automático, eu gosto do manual porque depende da luz e de outros fatores. Estou muito feliz com o resultado das fotos; venho aprendendo muito e acho que vou aprender cada vez mais. Aliás, conhecimento nunca é demais. Sempre fui curioso, de querer aprender e sempre estar em movimento.

Como foi participar do programa de mentoria Re_Modelar?

O projeto foi um pilar em minha vida. Eu trabalhava em duas emissoras na época em que o projeto começou. Estava muito cansativo e desgastante. Pensei comigo “Estou em um projeto que remodela, eu preciso remodelar também!”. Saí das duas empresas, prezando pela minha saúde, e decidi me dedicar à mentoria, enquanto procurava um novo trabalho. O que mais me impactou foi o relato da Bia, quando ela viajou e se deparou com uma publicidade que não mostrava pessoas negras em um país de população negra. Isso disparou um gatilho que realmente me fez abraçar o projeto, para estar presente em todas as reuniões. Tenho até hoje um caderno onde anotei muita coisa. O projeto foi muito bom para mim. Consegui outro trabalho, fiz curso e, hoje, trabalho com 3D, eventos, tenho projetos para o futuro, inclusive em 3D para a Shutterstock. A Shutterstock, a WMcCann e o projeto abriram muito a minha visão. Antes eu olhava apenas para frente. Hoje, consigo olhar para outras direções, olhar partes de um todo e olhar com outros olhos. O projeto era para remodelar e acabei me remodelando também. A mudança que eu tive internamente foi muito benéfica para mim. Ver tudo o que passamos desde o início, as pessoas se esforçando e entrando do transporte público ou chegando do trabalho, para chegarmos até aqui, foi muito bacana fazer parte disso.

Estamos caminhando rumo a mais representatividade

Qual a importância de projetos como este para a representatividade da população negra na publicidade?

Sempre fiquei indignado com a falta de representatividade. Se eu fizer uma busca hoje na internet, “médico bonito”, só aparecem médicos brancos. Na publicidade, é muito assim, também. Não há muitas pessoas pretas. E não há pessoas reais, não há naturalidade. É muito complicado, pois você não se vê ali. Eu vejo muito o papel da representatividade: agregar, a pessoa conseguir se ver. Por exemplo, uma propaganda que mostra uma pessoa bem sucedida – às vezes, a pessoa não se enxerga, ela fala “nunca vou conseguir chegar a isso”. Com esse projeto, podemos remodelar muito isso, porque estamos colocando pessoas pretas em cena. A Bia já tinha falado no início, de que chegaria o momento de a gente ter muito conteúdo stock com mais pessoas de verdade, não apenas sorrindo sentadas no escritório, e sim, mais realidade. Então, o projeto está agregando muito à sociedade. Estamos subindo degraus e acredito que tomará uma proporção muito grande, e crescer cada vez mais. Estou muito feliz de fazer parte da primeira edição.

Como a experiência da mentoria contribuiu para o seu trabalho?

Eu estava agindo muito em um “modo máquina” no trabalho, focado em produzir. Havia deixado de lado algo fundamental, que é a humanização. Na época, estava muito sobrecarregado e a fotografia era um hobby. Aos poucos, o projeto foi me mudando e me deu motivação. O projeto expandiu minha visão e minha mente para outras áreas, como a publicidade. Já trabalhava com planejamento, mas, se acontecia um imprevisto, eu ficava muito nervoso, não conseguia ter outra visão. O Re_Modelar trouxe mais este aspecto, de deixar tudo esquematizado e, se houver algum acidente, conseguir tomar outro caminho, enxergar outras direções. Além disso, antes do projeto Re_modelar, não me atentava a elementos que não deveriam aparecer, como marcas e lugares conhecidos. Hoje, tenho o olhar mais aguçado nestes detalhes, inclusive alerto os modelos para que suas roupas não tenham marcas. É bem mais fácil do que ter de arrumar depois fazendo retoques. Meu olhar está muito mais atento, vejo uma marca pequenina e desfocada em uma foto e já removo; mudou totalmente a forma como percebo os detalhes. Ando pela rua, observo algumas coisas e já penso que daria uma boa foto stock. Estou considerando andar pela rua com a câmera sempre comigo, porque há muita oportunidade. E, inclusive, imprimir algumas autorizações e deixar em minha mochila. Eu não tenho vergonha, falo que faço parte de um projeto e pergunto se posso tirar fotos. Até brinco na hora de pedir, que a foto pode ir parar fora do país. É muito legal ver minhas fotos sendo baixadas, sempre há alguém baixando. Já tive foto baixada na Austrália, na Alemanha, nos EUA, na China, no Japão, no Brasil, em São Bernardo do Campo (perto de casa!). É muito bom ver seu trabalho sendo reconhecido. A página da Shutter acabou sendo um portfólio para mim. 

Fotos naturais, do dia a dia, não requerem super produções

Como estão os planos para os seus próximos trabalhos?

Minha namorada é de Belém. Estamos planejando ir para lá no ano que vem. Já estou imaginando como vou representar o povo de lá e que preciso colocar na Shutterstock. A família dela tem uma influência indígena muito forte, tem parentes pretos, lá tem uma cultura gastronômica muito forte, tem os garimpeiros, os indígenas, muita coisa para retratar – já estou mentalmente planejando, com milhares de ideias, pegando referências aqui e ali, e pensando como vou colocar tudo isso na visão de Lucas de Freitas. Estou moldando os briefs dos meus próximos projetos, pensando e pesquisando o que colocar nas fotos. O que vai agregar à plataforma? O que vai agregar a mim mesmo? É como se fosse um estudo para mim, pensando nas cenas, no (a) modelo. Antes, não fazia isso. Hoje, faço um arquivo com tudo especificado, um PDF com tudo organizado.

Quais aprendizados você trouxe do projeto? Teria conselhos e dicas para outros fotógrafos que estão iniciando a carreira?

As mentorias abriram a minha visão para um outro nível. Antes, eu achava que, para você fazer uma foto, era preciso ter um cenário, ter a maior produção para ser adequada para stock. Eu pensava que não conseguiria fazer. Através do que foi passado nos encontros, foquei nas fotos mais naturais, do dia a dia. Fui reparando que não precisava ter um mega estúdio, uma superprodução, uma lente absurda, um equipamento incrível etc. O projeto me mostrou que é possível produzir fotos com pessoas e situações sem se preocupar demais com isso. No começo, tive fotos recusadas e fui analisar o que estava fazendo, eram questões de palavra-chave ou de autorizações, e estudei um pouco mais o material do projeto. Hoje, sou muito minucioso em relação ao título e às palavras-chave. Às vezes, uma palavra pode mudar e fazer com que sua foto seja encontrada em uma pesquisa.

E sobre seu equipamento e suas configurações? Poderia compartilhar como gosta de trabalhar?

Tenho uma Canon SL2 com o kit padrão, lente 18-55mm e lente 50mm. Tenho planos de adquirir a lente 18-35mm, que permite fazer várias fotos, tanto aberto como fechado, com detalhes. Eu me prendia muito ao equipamento, pensava que precisava ter um equipamento incrível para tirar boas fotos, mas, depois de mais vivência com a câmera, refleti que não era isso. Com o conhecimento da configuração da câmera, você pode fazer qualquer tipo de foto. Para foto na rua, a Canon SL2 é perfeita, assim como a lente 50mm, pois não chamam atenção por serem pequenas, já que, em São Paulo, pode ser perigoso. Já usei Sony e gosto para vídeo. Nunca usei Nikon, mas tenho em mente que sempre gira ao redor dos três pilares (ISO, velocidade do obturador, e o diafragma), com isso é possível tirar qualquer tipo de foto ou vídeo. Em relação à configuração, não há um padrão, depende muito da foto, varia de dia para dia, da luz do momento, que pode não ser a mesma do dia anterior. Costumo deixar a câmera pré-configurada para uma velocidade entre 120-160, para não ficar uma foto borrada com o movimento, para minhas fotos rápidas. Já no momento da edição, mentalmente tenho uma configuração. Uso o Lightroom, e gosto de tirar um pouco da saturação, aumentar o brilho, aumentar o contraste, e às vezes ajusto um pouco a cor. Posso, por exemplo, aumentar a cor vermelha especificamente. Hoje, prezo muito por fazer fotos em dias claros, assim as cores ficam mais vivas.

Qual é a sua perspectiva para o futuro?

Mais uma vez, é uma questão de degraus. Estávamos no primeiro degrau, enxergando mais representatividade no futuro, no alto. Estamos caminhando ainda, dia após dia. É um processo de formiguinha, pouco a pouco, de um coletivo que está junto. Sou muito grato, está sendo uma experiência para mim, a cada ensaio eu repenso o que poderia ter feito melhor, e por aí vai.

Lucas de Freitas, fotógrafo colaborador da Shutterstock, participou do projeto Re_Modelar

“Experiência cotidiana”

A perseverança e o olhar sensível de Lucas não passaram despercebidos pelo grupo de mentores do Projeto Re_Modelar. Nas palavras de Alex Rodrigues, Head da equipe de Atendimento a Contribuidores da Shutterstock, “o que realmente se destaca no trabalho de Lucas é como ele consegue mostrar de uma maneira simples e objetiva o dia-a-dia do brasileiro através da sua experiência cotidiana. Para quem o conhece, é fácil identificar que família, amigos e religião são importantes aspectos em sua vida. Através de sua lente, Lucas consegue registrar a beleza da simplicidade da vida brasileira registrando momentos e situações com pura autenticidade”.

Alex acompanhou de perto a evolução de Lucas durante as semanas do programa, e destaca a capacidade do profissional de aprimorar-se continuamente: “Lucas é um artista em busca de uma linguagem diferenciada dentro do seu trabalho fotográfico. Admiro em Lucas a maneira que ele absorve e retém informações, a sua persistência em querer aprimorar a sua técnica como fotógrafo, a sua ética profissional e sua determinação em promover diversidade e aumentar a visibilidade da população negra através da sua fotografia.”

Gabriella Cerqueira, Estrategista de Conteúdo para América Latina na Shutterstock, também faz parte da equipe de mentores. Sua visão e experiência na área de Criação coincide com Alex sobre a capacidade de Lucas de transformar momentos comuns em imagens de pura inspiração.

“Lucas tem uma habilidade natural de capturar momentos autênticos. Após concluir a mentoria, Lucas aproveitou todas as oportunidades para crescer seu portfólio stock com as pessoas e cenários cotidianos ao seu redor. Sua habilidade de fazer beleza do mundano, como sua avó saboreando uma laranja, é uma sinalização tanto à cultura brasileira quanto à sua expressão artística.  

Gabriella também destaca o espírito de constante evolução do artista e prevê um caminho de sucesso pela frente: “À medida que Lucas continua construindo sua coleção, seu trabalho cresce, dando passos rumo a novos cenários e conceitos. Seu ensaio mais recente, retratando a cerimônia de Umbanda, algo tão unicamente brasileiro, abre ainda mais as portas para a representatividade e a inclusão. Lucas continua a aumentar a representatividade da população negra brasileira através de seu trabalho, e sua energia contagiosa, tenacidade e força de vontade são a chave para causar impacto na plataforma.”

Imagens do Brasil podem ganhar o mundo

E falando em impacto, o Líder de Diversidade, Equidade e Inclusão na Shutterstock, Meeckel Beecher, discorre sobre o poder de iniciativas como esta para colaborar na criação de um marketing mais inclusivo, na frente e atrás das lentes: “As pessoas precisam se ver na publicidade porque é a coisa certa a fazer e porque todos nós temos poder aquisitivo. Eu não compro de marcas que não me incluem em seu marketing. Projetos como este ajudam a trazer uma abordagem mais autêntica à representação negra. E você precisa de pessoas negras para guiar como suas experiências aparecem na publicidade. Isso é representação.”

Idealizadora do projeto, Beatriz Lopes também compartilha algumas impressões sobre o artista: “É lindo ver o trabalho de Lucas e a forma como ele intensifica seu propósito. O que mais me chamou a atenção em suas fotografias foi o olhar do cotidiano e a sensibilidade de mostrar o mundo à sua volta. Uma das imagens que mais gostei foi a de pessoas no transporte público – ali, consegui ver a história por de trás da foto. Vi um fotógrafo com potencial para as fotografias stock. Lucas ama o que faz, e isso se reflete em seu trabalho e em suas fotos. Desde o início da mentoria, Lucas se mostrou apaixonado por tudo o que era apresentado, e essa paixão move a ele e a todos à sua volta. Ver as fotos do Lucas é enxergar o mundo da forma que ele vê. Hoje, na fotografia stock, ele consegue captar essa sensibilidade e contribuir na plataforma.”

Ainda segundo Beatriz, Lucas, a exemplo de todos os fotógrafos negros, têm uma perspectiva ímpar e extremamente importante para a publicidade, pois vem de um recorte de vivência e experiência que só ele viveu. “As fotos da avó de Lucas comendo uma laranja são minhas preferidas; eis a importância dele e de cada fotógrafo negro. É sobre nós narrando nossa própria história, é sobre minha vó se olhar em uma campanha e se enxergar, e essa sensibilidade única dele o faz único.”

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