Sede de conhecimento
Um bate papo com Saulo Adami, jornalista que enveredou pelos caminhos da produção audiovisual e não se arrependeu
Jornalista e escritor, o catarinense Saulo Adami é um daqueles comunicadores que não se contentam em abraçar uma ou duas vertentes de sua área de atuação. Prova disso é que ele também decidiu se dedicar à roteirização e produção de obras audiovisuais, um campo muito diferente daqueles em que se iniciou. Nosso entrevistado se define como “um perguntador” – e é essa curiosidade inesgotável que o levou a se envolver em projetos culturais como o recente O Dirigível e os documentários Expedições à Cidade Schneeburg (2013), Entreato: História do Teatro Amador de Brusque – TAB (2016), Vozes do Meu Vale (2017) e Com a Palavra: Celestino Sachet (2018). Nesta entrevista, ele fala sobre suas experiências no mercado de produção e revela mais curiosidades sobre os bastidores de O Dirigível.
CONFIRA ARTIGO ESPECIAL SOBRE O DOCUMENTÁRIO ‘O DIRIGÍVEL’
Entrevista com Saulo Adami
O DOCUMENTÁRIO O DIRIGÍVEL É UM PROJETO INDEPENDENTE – VOCÊ E SEUS PARCEIROS DE PRODUÇÃO, ALESSANDRO VIEIRA E CARLOS ALEXANDRE MARTINS, REALIZARAM O DOCUMENTÁRIO “NA RAÇA”, SEM CONTAR COM LEIS DE INCENTIVO. COMO VIABILIZARAM ESTE PROJETO?
Alessandro, Carlos e eu havíamos trabalhado no documentário de curta-metragem Expedições à Cidade Schneeburg (2013). Eles gostaram da ideia de produzir O Dirigível, mas logo avisei: “Eu não tenho dinheiro para bancar o filme!” Eles se entreolharam e responderam: “Nós também não!” Eventualmente, o projeto foi pago com recursos próprios e cobrimos as despesas à medida que estas se apresentavam. Fizemos investimentos mínimos e pontuais. E a cada etapa, cada um de nós (diretores e produtores) pagou suas despesas, incluindo transporte, hospedagem, alimentação… A maior parte das tarefas foi executada pelos profissionais da Griô Filmes. Cada um fez tudo o que estava ao seu alcance, empregando sua criatividade e utilizando suas habilidades e talentos.
FOI NECESSÁRIO TERCEIRIZAR SERVIÇOS PARA ESTA PRODUÇÃO?
Sim, na fase de pós-produção, foram terceirizados alguns serviços: narração, arte, criação da identidade visual (desenho de título, cartaz, banner…). Como não tínhamos data de lançamento, trabalhamos de acordo com o que nossas agendas profissionais permitiam. Ao final, como sempre acontece, tudo se ajeitou perfeitamente!
DE REPÓRTER E REDATOR, VOCÊ SE TORNOU UM PRODUTOR AUDIOVISUAL. COMO SE DEU ESSA TRANSIÇÃO NA SUA CARREIRA? REALIZAR UM DOCUMENTÁRIO É PARECIDO COM REALIZAR UMA REPORTAGEM? HÁ PONTOS DE CONEXÃO ENTRE AS DUAS ATIVIDADES?
Trabalhar como redator de jornais, escrever e editar meus próprios livros, atuar como assessor de comunicação social e escrever roteiros para filmes documentais são atividades exercidas simultaneamente desde a década de 1980. Nunca deixei de ser um “perguntador”. Esta atividade fez parte do meu trabalho nos jornais, nas assessorias de comunicação, nos livros biográficos e de história ou nos filmes. A entrevista é a conexão entre todas as minhas atividades profissionais. Meu principal cliente ou agenciador para os primeiros filmes documentais foi o Estúdio João Maurici, que produzia vídeos institucionais em Brusque e região. Ele me chamava quando suas produções exigiam roteiros mais elaborados. As primeiras páginas dos roteiros para documentários foram escritos na minha máquina de escrever, uma Olivetti Lettera 32, presente de meus pais, em 1975. Na década de 1980, quando comecei a escrever estes roteiros, vivíamos o encantamento das fitas VHS, dos caríssimos aparelhos de videocassete (adquiridos via consórcio) e da fascinação das videolocadoras! Hoje, estou me realizando profissionalmente com O Dirigível, uma produção que me permite utilizar todos os recursos e as ferramentas com as quais aprendi a trabalhar: o roteiro, a entrevista, a edição de imagens, a direção e a produção. Na pós-produção do documentário, tive oportunidade de recolocar em prática – depois de mais de dez anos afastado do setor – o serviço de assessoria de comunicação social: redigindo, distribuindo e estimulando a publicação de notícias sobre o filme, organizando agenda de exibições e divulgando seus conteúdos. Eu me considero um privilegiado por poder fazer com alegria todas estas tarefas ao lado das demais pessoas que participaram deste documentário, às quais agradeço por seu empenho e sua fé.
NORMALMENTE, EM QUE SE BASEIAM AS ESCOLHAS DOS TEMAS DE SEUS DOCUMENTÁRIOS? VOCÊ COSTUMA ABORDAR ASSUNTOS COM OS QUAIS TENHA AFINIDADE? OU UM “DOC” NASCE A PARTIR DA RELEVÂNCIA SOCIAL E CULTURAL DE UM DETERMINADO TEMA?
Meus primeiros documentários surgiram de encomendas. Quando tenho oportunidade de escolher os temas, prefiro trabalhar com assuntos ligados à história de Santa Catarina. Desde a estreia de Expedições à Cidade Schneeburg, tenho sido procurado para escrever roteiros de cunho histórico-jornalístico. Como roteirista, desenvolvo meus próprios projetos de documentário e, a partir do diálogo com os diretores ou produtores que conheço, faço as propostas de trabalho. Tenho tido bons parceiros, desde então.
QUAIS SÃO OS PROJETOS QUE MAIS O ESTIMULAM?
Gosto de trabalhos que tenham ligação com a história do Sul do Brasil. O documentário Vozes do Meu Vale (2017) foi proposto pelo diretor Darlan Serafini, que me convidou para escrever um roteiro que constasse a história e a preservação do dialeto bergamasco, trazido para o Brasil pelos imigrantes italianos que partiram de Bergamo, Itália, e se instalaram no Distrito Porto Franco, atual município de Botuverá, em Santa Catarina. Já que morei no interior de Santa Catarina a maior parte de minha vida, tive contato com descendentes de imigrantes alemães, italianos e poloneses que preservavam e falavam as línguas e dialetos de seus antepassados. Sugeri ao diretor que entrevistássemos estas pessoas, para que elas respondessem as entrevistas na língua ou no dialeto de origem de seus antepassados, e legendamos suas respostas em Português. Assim, o espectador pode assistir ao entrevistado falar na língua ou no dialeto que aprendeu, e que foi transmitido de geração a geração, desde meados do Século XIX, quando grandes embarcações trouxeram levas de imigrantes a Santa Catarina. Já os documentários Cartas da Prisão (2016) e Entreato: A História do Teatro Amador de Brusque – TAB (2016), nasceram de capítulos dos livros de histórias regionais que escrevi e publiquei entre 2005 e 2009. Ao mesmo tempo, eu queria ir mais longe na abordagem de temas. Foi quando tive a sorte de reencontrar a história dos dirigíveis. E pensei: “É isso! Quero voar!”
ONDE SERÁ EXIBIDO O DIRIGÍVEL? COMO OS ESPECTADORES INTERESSADOS PODERÃO TER ACESSO À OBRA?
Tivemos uma exibição experimental de O Dirigível durante a Mostra de Documentários “A História de Brusque Vai ao Cinema”, em 07 de agosto de 2019, na Fundação Cultural de Brusque. A estreia de O Dirigível será no dia 01 de dezembro de 2019, na Cinemateca de Curitiba, onde a história deste projeto começou. Naquele dia, 83 anos antes, o dirigível Hindenburg sobrevoou Brusque e Curitiba, vindo do Rio de Janeiro. Em seguida, será exibido em sessões especiais (escolas, universidades e cinematecas). E estará disponível em vídeo, com o documentário na íntegra e alguns extras (cenas deletadas, erros de gravação e trechos de entrevistas com outros temas relacionados às vidas dos entrevistados). No primeiro semestre de 2020, vamos percorrer o país. Queremos levá-lo à TV, disponibilizá-lo na internet… Cada coisa a seu tempo!
*Esta e outras reportagens você encontra na edição 218 da Zoom Magazine